Troncos no universo?

11/04/2023

Eu palpitaria que aqueles de nós que estamos agarrados a uma ideologia, ou a uma paixão, estaríamos agarrados a um tronco de árvore em um oceano um pouco imenso.

O universo não se importa com se você soltou um pum, arrotou, foi para a direita ou esquerda.

O universo é grande e sem consciência, aparentemente.

Agarrar-se ao tronco de (seu) Deus é mais um exemplo de tentar escapar deste naufrágio imenso, a imensidão de um universo que não muda, não sente, não quer saber seu nome nem suas paixões.

Só que tem gente muito inteligente, com muito dinheiro e recurso aqui entre nós, neste planeta - sim, dinheiro e recurso só vale entre nós, o universo se importa? Entre nós vale: move pessoas aqui no planetinha azul.

Nosso aspecto inteligente - aqueles de nós quando temos tempo para pensar - chafurda ir à Marte mas acaba indo para a essência do ser - imaginemos aulas de yoga, meditação, observar a própria mente.

Marte cura?

Não demora perceber que Marte não é a cura. É a cur-iosidade. Uma cura parcial, o alívio de um vício ou o prazer legítimo de explorar.

Então a essência do ser. Cura?

Mas a essência do ser também pode não curar. Pode ser apenas um tronco a se agarrar, em um universo imenso, que não liga.

Observamos nossa mente e nos desapegamos do próprio "ligar": não precisamos que ninguém ligue para nós. Nem o universo.

Estou pulando a parte em que "dizer que não se importa" é um blefe. Estou indo direto para aquele de nós que realmente se desapega de precisar que alguém ligue para si - supondo que isto seja possível.

Mesmo esse aspecto de nós que supere a necessidade de que alguém ligue para si. Essa mente sofisticada consegue se afastar de ser apenas um tronco no universo? Ou pelo menos um naviozinho maior?

E aquela mente, com ou sem lsd, que consegue descortinar nossa parte que se sente plenamente conectado com tudo e com todos, de átomos no universo a todos os seres vivos em um planeta? Aí sim, será que finalmente temos muito mais do que apenas um tronco para nos salvar na imensidão universal?

Sim, a mente - nem tanto Marte - nos silencia, acalma, incluindo poder ter noites ardentes de sexo - para não parecer algo chato e apenas quieto.

Podemos sentir ainda mais os prazeres. A serpente de tesão crescendo desde o início da coluna, inundando o corpo todo, com cada vez menos tensões, travas, com cada vez mais caminho livre, com uma mente atenta, íntima de tudo. Inundando, espalhando ondas de prazer de - mas não mais do que isso - revirar os olhos (e mil outras consequências possíveis).

Prazer então?

Esse é o tronco do prazer.

O tronco que mais entrega perspectiva de vida. Este tronco inclui não somente o tesão lá no ventre, mas também todas as preliminares e pontos de prazer - até mesmo um jantar, tanto pela comida em si, quanto pelo ritual. Um milhão de prazeres possíveis.

Mas volto: talvez percebamos, ou não deixemos de perceber, que mesmo o prazer se trata de um tronco para se agarrar em um universo bem grandinho (e que não liga).

recebendo uvas na boca

Mesmo com prazer, mesmo com a mente limpa, até mesmo indo à Marte ou - na moda esses dias - até mesmo com um chatGpt resolvendo tudo para nós, colocando uvas em nossas bocas e nós não precisando mais trabalhar (neste caso auxiliam o chatGpt vários braços robóticos, carros e caminhões autônomos - afinal as uvas precisam ser entregues nas nossas bocas, de graça, sem nenhum humano a ser pago neste caminho que transforma (cada vez mais) energia e átomos em coisas para nós: a teoria das árvores-robôs, como árvores de frutas).

Mesmo assim pode ser difícil esconder que o universo é grande e, talvez por isso, precisemos nos agarrar em ideologias, religiões, teoria do prazer, viagens interestelares.

Pelo menos no caminho para lugar algum não há como fugir do prazer, que delícia.